Maestrina Stella Neves Vale rege estrelas, auroras e crepúsculos na pauta celeste de São João del-Rei
Quando a noite do domingo passado, 28 de abril, chegou, cobriu com um manto negro o coração de São João del-Rei. Estrelas e lua cheia, sem clave de sol, no céu se organizaram em pauta silenciosa, a espera da maestrina que a partir de então as regeria. Os sinos, como poucas vezes nos trezentos anos da Vila de São João del-Rei, fizeram 24 horas de silêncio, solidários com a Música, que aqui perdera os braços de sua mãe. Dona Maria Stella Neves Valle deixou o mundo às 18 horas.
Deitada placidamente com o uniforme preto da Orquestra Ribeiro Bastos, no centro da sede da Sociedade de Concertos Sinfônicos, suas mãos agora inertes acariciavam flores brancas notas musicais - ternura eterna dos anjos negros-dourados-barrocos que comandava nos coros das igrejas de São João del-Rei. Agora Dona Stella ajudará o Criador a reger a sinfonia do universo, acenando as mãos com determinação carinhosa e austera para orientar estrelas, planetas, luas, cometas, brisas, estações, ventos, auroras e crepúsculos na pauta da abóboda celeste de sua São João del-Rei.
Na Matriz do Pilar, mirando de olhos cerrados o teto que espelha seu novo destino, ouviu mais uma vez - não pela última - trechos da Missa Breve do Domingo de Passos, Christus factus est e lamentosos responsórios dos Ofícios de Trevas.
Depois, atravessou o Largo do Rosário, seu caminho de todo dia, mas desviou-se à direita e, contrariando sua rotina, não adentrou a Rua Santo Antonio. Convicta e firme como sempre fora, subiu o beco-ladeira da Muxinga, passou em frente à capela do Divino Espírito Santo, ouviu o Miserere e cruzou a porta eterna que a levou para junto de seus pais.
No entardecer daquela segunda-feira, quando o sino das Almas, choroso, tocou Ângelus, um conforto aliviou o coração do povo de São João del-Rei: o legado que a maestrina Maria Stella Neves Valle, dona Stella, deixou é infinito. Tanto, que por maior que doravante seja o sentimento por sua ausência, jamais conseguirá se assemelhar a tudo o que ela, generosamente, fez pela cultura, pelos músicos, pela Orquestra Ribeiro Bastos, pela música barroca, por São João del-Rei, por Minas Gerais e pelo Brasil. Isto sem dizer que a música é patrimônio universal...
Estrela luminosa da Orquestra, Dona Stella agora é a mais nova orquídea do buquê roxo do Senhor dos Passos!
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Bela homenagem Emilio! Não a conhecia mas é engraçado como a música nos aproximava e assim nos tornávamos íntimas.
ResponderExcluirAbçs
KK, Dona Stella merece.
ResponderExcluirHá conheci desde sempre e - apesar de não termos grande proximidade - era (e é) grande a admiração e o respeito que ela tem de mim por sua dedicação, firmeza e convicção. Acho que doravante o cultivo da música barroca em São João del-Rei pode ser dividido em duas eras: aDS e dDS (antes de Dona Stella e depois de Dona Stella).
Grande abraço.