De interior bastante simples e fachada totalmente atípica em relação às demais igrejas setecentistas e oitocentistas de São João del-Rei, contemporâneas a ela, a igreja de São Gonçalo Garcia demorou 131 anos para ficar pronta. Sua construção atravessou parte do século XVIII, todo o século XIX e o começo do século XX, tendo se iniciado em 1772 e só terminado em 1903. A conclusão de seu entorno, no formato atual, avançou até 1915, quando ficou pronta sua bela, semicircular e alta escadaria.
Sobre a evolução da obra, o viajante Richard Burton, quando passou por São João del-Rei em 1868, na viagem do Rio de Janeiro a Morro Velho, registrou em sua caderneta de anotações:
"A igreja de São Gonçalo Garcia ... é uma simples casca, uma inacabada ruína,
de tão exposta, e, sem dúvida, exigirá muito tempo para se tornar uma casa
de Deus apresentável". Sua previsão de futuro foi acertada...
A Irmandade de São Gonçalo Garcia de São João del-Rei, ligada à aristocrática Ordem Terceira de São Francisco de Assis da Penitência, era a alternativa franciscana para os homens pardos e crioulos. Sua criação é anterior a 1759 e tinha sede na capela de Nossa Senhora das Mercês.
Em tempos passados, a Irmandade de São Gonçalo promovia, esporadicamente, a Procissão dos Mártires que, a exemplo da Procissão das Cinzas, era um cortejo de muitas insígnias e figurantes inusitados, tirados dos mais diversos capítulos da iconografia católica e da história bíblica.
Consta, por exemplo, que, em 1886, a dita procissão tinha "26 figurantes de mártires, sendo 6 adultos e 20 fradinhos" que, portando-se como os tradicionais penitentes espanhóis, carregavam cruzes. Além deles, se destacavam as alegorias da Fé, da Esperança e da Caridade, Adão e Eva e a heroína Judith, tendo às mãos uma espada sangrenta e a cabeça do gigante Holofernes. Verdade ou exagero, acredite quem quiser, o jornal Astro de Minas divulgou que a procissão daquele ano foi vista por dez mil pessoas.
Um anúncio crítico e capcioso - Chamando para o grande evento, dias antes da curiosa procissão, o mesmo periódico veiculou, há 126 anos, o seguinte chamado:
"Precisa-se de um oficial da guarda nacional, fardado,
para servir de tirano na Procissão dos Mártires.
Quem quiser, apresente-se e, se servir bem, garante-se-lhe
o papel de Abraão na procissão de Sexta Feira Santa.
Além do cartucho (de amêndoas doces), gratifica-se
com uma penca de 25 cobres ou 1$000."
O assinante da convocação? Zé de Mamão!
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Fonte: GAIO SOBRINHO, Antonio. Visita à Colonial Cidade de São João del-Rei. Fundação de Ensino Superior de São João del-Rei - FUNREI. São João del-Rei, 2001.
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