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São João del-Rei tem 'mania de rebordar o passado'

Muitos e belos textos falam sobre São João del-Rei, mas em sua maioria essas obras são manifestações espontâneas e, por isso, estão dispersas. Como não vieram a público, acabam pouco conhecidas dos são-joanenses, o que é uma pena.

O texto abaixo é um precioso exemplo. Escrito pelo então estudante de Publicidade e Propaganda  na UNIPAC Barbacena e integrante do grupo teatral "Ponto de Partida", Marcos Faria de Oliveira, mais do que uma belíssima homenagem, é verdadeira declaração de amor a Minas Gerais e a São João del-Rei. Digna de aplausos.

Como são-joanense, agradeço ao autor: Valeu, Marcos, obrigado!

Minas e suas vozes

"Entre ferrovias e sinos de verdades incontestáveis, sobressai entre montanhas e vilarejos um ponto chamado Minas, que nas Gerais absorve em seu cotidiano palavras escondidas nas varandas das casas. Entre nomes curtos de pessoas e mundos, a qualquer segundo, as ferraduras de um cavalo pode tirar sua atenção daquela história que seu avô contou ou que está aqui, em Minas mesmo. Essas histórias trazem, ao sabor do café forte e do pão de queijo do forno, coisas que até Deus duvida.


Quando nossos olhos miram em Minas, basta apontar o dedo que aparece naquele pontinho do mapa a cidade de São João del-Rei, nome dado em homenagem a Dom João V, rei de Portugal. E ali, naquele povoado guardado por Deus, descobriu-se pedras de amarelo-ouro, com grandes valias guardadas em sua dureza, que fez dela, de arraial a cidade.


Minas esconde, esconde sempre uma boa lembrança ou nomes de força em seus nacos de história. Há quem diga que o Rio das Mortes, em suas águas de barro e margens já esquecidas, cobre, com sua fundura, algumas riquezas e algumas almas. Porém não se sabe ao certo; por isso torna-se segredo de lendas e casos.


Temos razão apenas em algo: Minas tem mania de diferente, mania de bordar o passado, reinventar o momento e criar linhas, linhas de trem, pesadas em rodas de ferro da maria-fumaça cortando as Gerais. E nessas estações salpicadas de reminiscências, ouve-se de bocas curiosas o caso do senhor de chapéu coco que olhou para um poste e disse  por que não um jornal para todos? E nessa sandice os postes se tornaram jornal, mesmo com as dúvidas de quem duvidava, e permanece até hoje com o mesmo título "O Jornal do Poste". Este, sobrevive de letra em letra há não sei quanto tempo, porém muitos o sabem, até no exterior. 


Em traços de cores e muitas ideias, soube-se que a cultura de Minas é muito forte, coisa nossa. E plantando sementes de arte no chão que, árido, perde a esperança, Minas continua e a cultura mineira é cultura de acolher nos braços e cantar de peito aberto em qualquer espaço, pintado, descascado, pouco.


E perdendo horas a fio, assim fico imaginando, nesse mundo de coisas interioranas, imaginando que às vezes os sinos falam, que São João del-Rei é santo, que a maria-fumaça troca de cor quando o sol se esconde e que o Rio das Mortes é feito mesmo de vida.


Não tem jeito, aqui tudo muda sempre, agrade ou não. O que importa é viver, nessas Minas Gerais."

Comentários

  1. Obrigada Emílio pela oportunidade de ler um texto tão lindo!
    Parabéns Marcos Faria!!!

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  2. Patrícia, também acho esse texto uma radiografia precisa e fiel do que muitos tentam conceituar e definir como mineirismo, mineirice e mineiridade.

    Gostaria muito de conhecer Marcos Faria de Oliveira, para agradecer e parabenizar pessoalmente.

    Grande abraço. Emilio.

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  3. Ola gente, então, só agora pude ler este texto que escrevi há tanto tempo atrás. Anotem meu e-mail marcosfari@gmail.com

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  4. Ai, ó, Marcos existe e todos nós que apreciamos seu texto, inclusive publicado com gravação de imagem e sons em 10.abril.2011 no link http://diretodesaojoaodelrei.blogspot.com/2011/04/cartao-postal-de-sao-joao-del-rei-que.html, podemos agora lhe dizer: valeu, Marcos, obrigado! São João del-Rei agradece...

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